
Brasília, 6 de maio de 2025 — O Partido Democrático Trabalhista (PDT) anunciou, em decisão unânime de sua bancada na Câmara dos Deputados, o rompimento com a base aliada do governo do presidente Luiz Inácio Lula da Silva (PT). A resolução, formalizada nesta terça-feira, vem na esteira da demissão do ex-ministro da Previdência Social, Carlos Lupi, envolvido em um escândalo de fraudes no Instituto Nacional do Seguro Social (INSS), que gerou prejuízos estimados em R$ 6,3 bilhões entre 2019 e 2024. A saída do PDT, um aliado histórico do PT, representa um revés significativo para a coalizão governista, que enfrenta desafios crescentes no Congresso Nacional às vésperas das eleições de 2026.
A decisão foi tomada em reunião da bancada pedetista, composta por 17 deputados federais, que expressaram profundo descontentamento com o tratamento dispensado a Lupi, presidente licenciado do partido. A exoneração do ex-ministro, formalizada em 2 de maio após uma operação da Polícia Federal e da Controladoria-Geral da União (CGU) que revelou descontos indevidos em aposentadorias e pensões, foi percebida como um gesto de desrespeito pelo PDT. A nomeação de Wolney Queiroz, então secretário-executivo da pasta e também filiado ao partido, como sucessor de Lupi, não aplacou as tensões, especialmente por não ter sido previamente negociada com a cúpula pedetista. “A maneira como Lupi foi tratado causou extremo constrangimento ao partido”, declarou o deputado André Figueiredo (PDT-CE), líder da legenda na Câmara, reforçando que a bancada adotará uma postura de independência nas votações parlamentares.
A crise foi agravada pela postura do ex-presidenciável Ciro Gomes (PDT), que classificou a substituição de Lupi por Queiroz como uma “indignidade inexplicável” em comentário nas redes sociais. Figura central do partido e crítico contumaz da atual gestão petista, Ciro tem capitalizado o episódio para reacender sua influência dentro do PDT, com aliados enxergando na ruptura uma oportunidade para reposicioná-lo como alternativa presidencial em 2026. “A ala cirista do partido vê na crise um momento de inflexão para retomar o protagonismo político”, afirmou um parlamentar pedetista em condição de anonimato, destacando que a fidelidade do PDT ao governo, expressa em 92,46% das votações na Câmara desde 2023, estava atrelada à presença de Lupi no ministério.
A saída de Lupi, que comandava a Previdência desde o início do terceiro mandato de Lula, foi precipitada por investigações que apontaram irregularidades em mensalidades associativas descontadas sem autorização de beneficiários do INSS. Documentos revelam que Lupi e Queiroz foram alertados sobre as fraudes em uma reunião do Conselho Nacional da Previdência Social em junho de 2023, mas medidas efetivas só foram tomadas quase um ano depois. A demora na resposta e a recusa inicial de Lupi em demitir o então presidente do INSS, Alessandro Stefanutto, apadrinhado pelo PDT, desgastaram sua posição no governo. A nomeação de Gilberto Waller Júnior para o comando do INSS, sem consulta ao partido, foi interpretada como um sinal de perda de prestígio político.
No Planalto, esforços para conter o impacto da ruptura foram liderados pela ministra das Relações Institucionais, Gleisi Hoffmann, que destacou o PDT como “um aliado histórico” e “fundamental” para a base governista. Apesar das negociações, que incluíram a indicação de Queiroz para manter o partido no comando da Previdência, a bancada pedetista optou pela independência, sinalizando que o apoio a pautas do governo será avaliado caso a caso. “Não há rompimento formal, mas a relação será rediscutida”, afirmou Figueiredo, sugerindo que o PDT buscará maior autonomia em suas decisões legislativas.
A debandada do PDT acende um sinal de alerta para o governo Lula, que enfrenta uma oposição fortalecida pela articulação de uma Comissão Parlamentar Mista de Inquérito (CPMI) para investigar as fraudes no INSS. Lideranças do Partido Liberal (PL) e outros oposicionistas, como o senador Rogério Marinho (PL-RN), prometem manter a pressão, com críticas à nomeação de Queiroz, descrita como “trocar seis por meia dúzia”. A perda do apoio pedetista, cuja bancada foi decisiva em votações apertadas, pode complicar a aprovação de projetos prioritários, como reformas econômicas, em um Congresso já marcado por tensões políticas.
Enquanto isso, o PDT enfrenta seus próprios desafios internos. A legenda, que viu seu número de prefeitos eleitos cair pela metade nas eleições municipais de 2024, luta para reverter uma trajetória de encolhimento e cumprir as cláusulas de barreira em 2026. Carlos Lupi, que reassumiu a presidência do partido, já sinaliza conversas com PSB e Cidadania para a formação de uma federação, mas a saída de Cid Gomes (PSB), irmão de Ciro, e de aliados regionais enfraquece sua posição. A decisão de abandonar a base aliada, embora unânime, expõe divisões entre a ala pragmática, que teme o isolamento político, e os apoiadores de Ciro, que defendem uma postura oposicionista mais incisiva.
À medida que o Brasil se aproxima de um novo ciclo eleitoral, a ruptura do PDT com o governo Lula reconfigura o tabuleiro político nacional. A legenda, outrora pilar da esquerda brasileira sob a liderança de Leonel Brizola, parece buscar um novo caminho, entre a reinvenção e o risco de marginalização. Para o Planalto, a tarefa é conter o desgaste e evitar novas deserções, enquanto a oposição aguarda, atenta, por brechas para intensificar sua ofensiva. O desfecho dessa crise, como tantos outros na política brasileira, dependerá das costuras nos bastidores e da capacidade de cada lado em transformar revezes em oportunidades.